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Professora graduada no Curso Normal Superior pela Universidade de Uberaba-MG,pós-graduada em Coordenação Pedagógica-UFOP-MG, atuando na área de Ensino Fundamental e Médio.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

O problema da pesquisa escolar na Internet


 TIC-Tecnologias da Informação e Comunicação - TIC correspondem a todas as tecnologias que interferem e medeiam os processos informacionais e comunicativos dos seres. Ainda, podem ser entendidas como um conjunto de recursos tecnológicos integrados entre si, que proporcionam, por meio das funções de hardwaresoftware e telecomunicações, a automação e comunicação dos processos de negócios, da pesquisa científica e de ensino e aprendizagem.

Já dispomos de milhares de publicações, livros, artigos e papers tratando do uso da Internet como ferramenta de pesquisa e é um consenso entre educadores que utilizam as TICs que a Internet é, sem dúvida, a maior fonte de pesquisa disponível de forma acessível aos alunos. Portanto, não pretendo focar aqui na utilidade da Internet como fonte de pesquisa, o que estou dando como fato concreto, e sim nas mudanças do percurso de aprendizagem dos alunos ao utilizarem a Internet como meio de obtenção de informações e na necessidade de compreender essas mudanças para ensinar melhor e permitir que o aluno aprenda mais.
Toda pesquisa é, em sua essência, uma coleta de informações a partir das quais se podem produzir resultados variados, que vão desde o uso imediato da informação coletada até a produção de novas informações e novos conhecimentos a partir da análise, desconstrução e reconstrução dos conhecimentos obtidos com a pesquisa.
A pesquisa escolar, quando voltada aos alunos do Ensino Básico e, em especial, aos alunos do Ensino Fundamental, visa objetivos bastante amplos, dos quais, para efeitos ilustrativos, relaciono apenas dez objetivos gerais e mais cinco relativos ao uso das TICs:
  1. desenvolver atitudes autônomas de busca de informações;
  2. desenvolver a habilidade de usar diferentes meios de pesquisa (livros, revistas, entrevistas, experimentações, Internet, CDROMs e muitas outras fontes);
  3. desenvolver a habilidade de leitura e interpretação de textos;
  4. expandir o universo textual do aluno, colocando-o diante de diferentes formas de linguagem (textos com diversas formas de linguagem, figuras, gráficos, ilustrações, imagens, filmes, etc.);
  5. desenvolver a capacidade de análise e síntese das informações (respeitado o nível de desenvolvimento cognitivo da série e faixa etária do aluno);
  6. desenvolver habilidades artísticas relativas à apresentação gráfica dos trabalhos de pesquisa produzidos, fazendo-se uso de imagens e ilustrações diversas, bem como de programas e instrumentos de produção artística;
  7. desenvolver a habilidade de escrita, reescrita e produção textual;
  8. desenvolver habilidades de comunicação ao apresentar os resultados da pesquisa;
  9. desenvolver habilidades de trabalho colaborativo (pesquisando-se em grupos e contando com apoio de adultos);
  10. trabalhar questões de ética e cidadania relativas à propriedade intelectual;
  11. desenvolver habilidades no uso das TICs (computadores, Internet, gravadores, filmadoras e outras tecnologias de pesquisa, armazenamento de informações, tratamento de textos e imagens, etc.);
  12. desenvolver habilidades de pesquisa usando-se bancos de dados não classificados (uso da Internet);
  13. desenvolver habilidades de comunicação digital (produzir textos, apresentações, filmes e outros materiais em mídias digitais, trocar informações e colaborar por meios digitais);
  14. desenvolver habilidades de publicação digital (publicar em blogs, comunidades, galerias de imagens, etc.);
  15. desenvolver habilidades de integração de diferentes mídias (uso de multimídia: texto,som e imagem).
Google
Os "buscadores" são parte de uma revolução gigantesca na forma de se acessar informações dispersas por todo o planeta.
Embora o universo de aprendizagens relativo à pesquisa escolar seja imenso, poucos são os professores que têm consciência da maioria dessas possibilidades de aprendizagem e, portanto, poucos planejam pesquisas voltadas a essas aprendizagens – principalmente as cinco últimas listadas, que dizem respeito ao uso das TICs. O resultado que normalmente se vê, e se critica, são trabalhos de pesquisa que consistem basicamente nos processos de Ctrl+C & Ctrl+V, ou seja, na cópia e cola de textos ou excertos de documentos e imagens que depois são impressos e entregues ao professor.
Vendo-se diante do problema de receber trabalhos de pesquisa que são meras cópias, muitos professores tentam impedir que o aluno faça uso do computador e da Internet e, nessa tentativa, solicitam que os alunos lhes entreguem os trabalhos “escritos à mão”, como se “escrever à mão” fosse alguma espécie de garantia de que o aluno fez o trabalho ao invés de apenas copiá-lo. Argumentam também que, tendo que copiar à mão, o aluno é obrigado a ler o texto que está copiando. Esquecem-se, esses professores, de que “copiar à mão” é tão somente uma forma rudimentar de cópia e que todos nós podemos copiar textos escritos em línguas que não compreendemos sem cometer nenhum erro gramatical e sem compreender absolutamente nada do que estamos copiando.

As origens do problema


Monges copistas
Monges copistas (Gravura do século XIII). Sugestão de filme sobre o tema: "O nome da Rosa".
Com o advento das tecnologias digitais, e principalmente da Internet, as queixas sobre pesquisas escolares copiadas na íntegra parecem ter aumentado muito e a facilidade com que se pode copiar textos integral ou parcialmente dá-nos a idéia de que a Internet criou uma cultura de copiar e colar que até então não existia. Mas isso não é verdade. A reprodução de textos na íntegra ou de excertos reorganizados em um novo texto é uma prática que remonta o advento da escrita.
Os alunos sempre copiaram textos nas pesquisas escolares e os trabalhos que eram antes entregues com cópias à mão não possuíam um conteúdo melhor do que os que são hoje copiados eletronicamente. Na verdade os trabalhos copiados eletronicamente são bem mais ricos em informações e conteúdos do que os de “antigamente” porque a mídia digital permite agregar mais textos e imagens com um custo de elaboração muito menor.
A única diferença entre os trabalhos copiados antes da era da Internet e os trabalhos copiados agora está no pressuposto altamente questionável de que ao fazer uma cópia “à mão” o aluno aprende aquilo que copia. Esse pressuposto é questionável porque a prática da cópia manuscrita não implica em aprendizagem do conteúdo que se copia e a leitura empregada em uma atividade de cópia não tem o caráter de busca de compreensão do texto copiado.
Pesquisas escolares apresentadas como simples cópias de textos, sejam eles obtidos na Internet ou em algum livro da biblioteca escolar, originam-se de uma série de fatores que estão diretamente ligados à atuação do professor. Dentre eles cito alguns:
  1. Falta de planejamento pedagógico do professor. Como em qualquer atividade pedagógica, é preciso ter claros os objetivos, recursos, métodos, formas de avaliação e redirecionamentos futuros. Pesquisas precisam ser “planejadas como projetos” e não apenas “solicitadas como atividades”;
  2. Falta de clareza na proposta de pesquisa e falta de orientação adequada aos alunos sobre os procedimentos envolvidos em uma pesquisa escolar de forma geral. Os alunos precisam ter claros os procedimentos que terão de empregar para executar a pesquisa. Isso equivale a produzir e distribuir inicialmente aos alunos uma rubrica de avaliação do trabalho de pesquisa solicitado a eles;
  3. Forma pobre com que a pesquisa é proposta, geralmente como uma “coleta genérica de dados”. Trabalhos de pesquisa são bem mais interessantes quando propostos como “caça ao tesouro”, “webquest”, “desafios” e “problemas abertos” que demandem a pesquisa proposta como ferramenta de resolução e não como produção final;
  4. Falta de disposição do professor para analisar as produções de maneira crítica e construtiva, resumindo-se apenas ao trabalho de “coletar e classificar a pesquisa”. Se, por um lado o aluno usa do artifício de copiar e colar, por outro, muitos professores apenas “pesam o trabalho” e o avaliam pelo número de páginas ou pela apresentação visual, sem realmente analisarem a pesquisa em si, o roteiro de produção do aluno e, principalmente, a efetividade da aprendizagem decorrente da pesquisa;
  5. Abandono intelectual do aluno durante o processo de pesquisa. Para muitos professores o aluno deve ser capaz de fazer, de uma única vez e sem apoio do professor, uma pesquisa que retorne exatamente o que o professor deseja e da forma como ele gostaria que a pesquisa fosse feita. Uma pesquisa escolar é um processo que precisa ser assistido, apoiado e redirecionado enquanto ocorre e não apenas avaliado depois de finalizado.
Portanto, a origem do problema da metodologia de copiar e colar empregada pelos alunos não está em uma “falha de caráter dos alunos”, na sua “preguiça de ler e resumir” ou na “facilidade com que se pode copiar e colar textos inteiros ou excertos e imagens da Internet”, mas sim na incapacidade do professor de propor, apoiar, acompanhar e participar com o aluno de pesquisas onde a cópia pura e simples não atenda aos requisitos previamente definidos na tarefa.
Se o professor quiser ensinar ao seu aluno sobre energia solar e seu uso e, para tanto, pedir ao aluno que simplesmente “faça uma pesquisa sobre energia solar”, ele retornará com uma grande pilha de papéis que podem não ter nenhuma relação com a informação que se gostaria que ele tivesse acessado e compreendido, mas que certamente terão alguma vaga relação com o tema “energia solar e seus usos”. Mas se o professor propor ao aluno que construa um “fogão solar” ele certamente fará pesquisas sobre energia, energia solar, fogões, usos da energia, etc., e, possivelmente, terá que conversar com outras pessoas, solicitar mais ajuda, coletar dados, resumir, ler e compreender, obter recursos, criar um protótipo e ser capaz de apresentá-lo, explicando seu uso e a relação entre a energia solar e o aparato tecnológico propriamente dito. Para isso tudo ele consultará a Internet e talvez copie e cole muitas coisas, mas ao final ele não retornará simplesmente com uma pilha de papéis cujo conteúdo ele mesmo desconhece.
Observe que no exemplo acima a pesquisa é tratada como um “processo” e não como um fim em si mesma.

Sugestões de leituras na Internet:

  1. As Novas Tecnologias da Informação e Comunicação e a Pesquisa Escolar: O artigo aborda a pesquisa baseada em fontes pessoais, bibliográficas e eletrônicas e as formas de procedimentos dos alunos para a realização do trabalho.
  2. A Pesquisa Escolar em Tempos de Internet: A problemática da pesquisa da e para a escola. As autoras buscam compreender, através do discurso de adolescentes entrevistados, a construção/produção da pesquisa escolar na Internet, buscando a sua funcionalidade no contexto do ensino e o seu papel na constituição do sujeito leitor-escritor. Com suporte na teoria enunciativa da linguagem de Bakhtin, elas procuram analisar a questão da autoria da pesquisa escolar, focalizando-a em sua dimensão textual/discursiva.
  3. A Internet na pesquisa escolar: um panorama do uso da web por alunos do ensino fundamental: Estudo de pesquisadores da UFMG que tem como objetivo verificar o uso da internet por alunos do ensino fundamental, com ênfase nos seus trabalhos escolares.
  4. Mudanças geradas pela Internet no cotidiano escolar: as reações dos professores: Análise de 20 entrevistas realizadas com professores do ensino Fundamental e Médio de escolas particulares do Rio de Janeiro. Respostas, reações, comentários e atitudes indicam que tais mudanças os têm atingido profundamente e feito enfrentar dolorosos conflitos internos.
  5. A Internet como ambiente de pesquisa na escola: Último capítulo do livro “novas tecnologias na educaçao: reflexoes sobre a pratica” de Luis Paulo Leopoldo Mercado, disponível para leitura no Google Livros.
  6. Oficina de Pesquisa na Internet: Uma oficina de formação de professores desenvolvida pela equipe do Educarede visando capacitar professores para o uso da Internet como fonte de pesquisa e, assim, possibilitar que esses professores capacitem seus próprios alunos para o uso proficiente da Internet como meio de pesquisa.
  7. Dez conselhos para evitar o “copiar e colar”: Apresentação de slides disponibilizada no blog Informática Educacional e Meio Ambiente da professora Miriam Salles (que fez a tradução da apresentação para o português).

(*) Para citar esse artigo (ABNT, NBR 6023):
ANTONIO, José Carlos. Pesquisa escolar na Internet: Ctrl+C & Ctrl+V versus Cópia Manuscrita, Professor Digital, SBO, 31 jan. 2010. Disponível em: <http://professordigital.wordpress.com/2010/01/31/pesquisa-escolar-na-internet-ctrlc-ctrlv-versus-copia-manuscrita/>. Acesso em: [coloque aqui a data em que você acessou esse artigo, sem o colchetes].

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